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Organizações da diáspora e tecnologia: O papel da diáspora afegã-neerlandesa na luta contra o COVID-19

ALI AHMAD SAFI  |  23 JUNHO 2021  |  EDIÇÃO 15  |  TRADUZIDO DO INGLÊS

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A Equipa do Comité Médico Afeganistão-Países Baixos. Fonte: MCAN (Comité Médico Afeganistão-Países Baixos)

O transnacionalismo evoluiu com o avanço das novas tecnologias, o que facilitou as atividades transfronteiriças das diásporas em geral, mas especialmente em tempos de crise, como na pandemia do COVID-19. As organizações da diáspora desempenham um papel vital na conexão entre os países de acolhimento e de origem e na compreensão da dinâmica da migração. Desde o início da pandemia, as plataformas virtuais na internet criaram enormes oportunidades para que a diáspora se envolva amplamente com os países de origem, compartilhando os conhecimentos mais recentes sobre o COVID-19 e iniciando diálogos. Especialistas em migração, decisores políticos, investigadores e meios de comunicação têm-se concentrado principalmente nas contribuições financeiras da diáspora e nas organizações diaspóricas. Mas, como qualquer outra infraestrutura social, as organizações da diáspora afegã também prestam apoio social, cultural, político e de desenvolvimento ao Afeganistão. 

 

O primeiro caso de COVID-19 no Afeganistão foi oficialmente anunciado em 24 de fevereiro de 2020, na província ocidental de Herate, e logo se espalhou a todo o país. De acordo com a Universidade John Hopkins, que rastreia casos confirmados de COVID-19 em todo o mundo, até ao dia 13 de junho de 2021, o vírus tinha infetado 88.090 afegãos, dos quais 3.449 perderam a vida. Por ser um país de poucos recursos, a pandemia afetou o sistema de saúde do Afeganistão, que tem o menor número de profissionais de saúde do mundo, com 1,9 médicos por 10.000 habitantes. Num inquérito feito aos profissionais de saúde do Afeganistão durante a pandemia, 85% destes profissionais testaram positivo nos primeiros cinco meses da infecção. Desde o início da pandemia, a violência armada em todo o Afeganistão também matou milhares de civis afegãos, agravando a situação causado pela pandemia.

 

A pandemia encorajou o Comité Médico Afeganistão-Países Baixos (MCAN, na sigla em inglês), uma organização da diáspora afegã com sede nos Países Baixos, a transferir os seus conhecimentos médicos mais atualizados sobre o diagnóstico e tratamento de pacientes com COVID-19 para os médicos e profissionais de saúde no Afeganistão, usando as redes sociais da organização e outras plataformas virtuais, como o Zoom.

 

“A pandemia abriu os nossos olhos para usarmos várias oportunidades que a internet oferece. Antes da pandemia, pensávamos em viajar para o Afeganistão para transmitir os nossos conhecimentos através de palestras e programas de formação, mas a disseminação do coronavírus forçou-nos a pensar fora da caixa”, lembrou Razma Paykardjoe, presidente do MCAN.

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Fundado em 2014, em Utreque, por um grupo de profissionais médicos da diáspora afegã nos Países Baixos, o MCAN perseguiu três objetivos principais desde a sua criação: partilhar conhecimento, construir redes e colaborar para se tornarem mais fortes. Por meio das suas atividades transnacionais, o MCAN tenta contribuir para a reconstrução do sistema de saúde do Afeganistão. Desde a sua fundação, o MCAN implementou dois projetos médicos transnacionais usando plataformas online, incluindo o UpToDate e o eSurgery. A pandemia também inspirou o MCAN a criar outro projeto com o objetivo de conectar médicos afegãos no Afeganistão com a diáspora afegã em toda a Europa. 

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Durante a primeira onda de COVID-19 no Afeganistão, o MCAN conseguiu desenvolver uma diretriz em parceria com médicos afegãos-neerlandeses que trabalhavam em hospitais dos Países Baixos. A diretriz, intitulada “COVID-19: Uma diretriz prática para profissionais de saúde no Afeganistão”, foi elaborada numa tentativa de fortalecer a gestão clínica de pacientes com COVID-19 e fornecer instruções atualizadas sobre como diagnosticar e tratar os pacientes, tendo em consideração os recursos limitados do setor médico no Afeganistão. “Queríamos transmitir as abordagens e práticas mais recentes para combater o COVID-19 nos Países Baixos aos médicos e hospitais no Afeganistão”, afirmou Paykardjoe. 

 

Esta organização, da diáspora afegã-neerlandesa, realizou uma série de seminários virtuais sobre temas relacionados com o diagnóstico e tratamento do COVID-19. A “nova normalidade”, com o apoio de várias plataformas tecnológicas, ajudou a chegar a mais médicos e profissionais de saúde, não só na capital, Cabul, mas também a Herate e Farah, na zona oeste do país, e a profissionais de saúde nas províncias de Mazar e Xarife, no norte. Paykardjoe disse que, embora o vírus tenha tido um impacto global negativo desde o seu aparecimento, a organização atingiu numerosas vitórias durante a rápida disseminação do vírus. De acordo com Paykardjoe, o acesso à internet pelos profissionais da saúde no Afeganistão possibilitou o que parecia difícil na era pré-pandemia. Ela reiterou que as várias plataformas tecnológicas facilitam a conexão com um público maior do Afeganistão devido ao uso generalizado da internet entre os profissionais de saúde, especialmente entre os médicos. 

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De acordo com Paykardjoe, entre 40 e 50 médicos de vários hospitais privados e públicos no Afeganistão participaram nos seminários virtuais semanais do MCAN sobre o COVID-19. A organização da diáspora também partilhou os seminários virtuais gravados na sua página do Facebook, no canal do YouTube e no seu website, e os interessados neste tema puderam assistir aos seminários posteriormente. Outro elemento positivo desta formação transnacional foi o fato de que o MCAN removeu a barreira linguística e conduziu todos os seus seminários virtuais nas duas línguas oficiais do Afeganistão, o dari e o pachto, aumentando a utilidade e o alcance do programa em diferentes hospitais do Afeganistão. O desafio, relata Paykardjoe, é saber quantos participantes realmente beneficiam das palestras online, porque a organização ainda não foi capaz de avaliar os seus serviços. 

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Como um dos participantes da transmissão transnacional de conhecimentos do MCAN, o Dr. Farid Rafiee, que trabalha no hospital Wazir Akbar Khan, em Cabul, obteve grandes benefícios com os seminários virtuais. Durante a sua conversa com o autor, Rafiee disse que os profissionais de saúde no Afeganistão não sabiam quais as medidas necessárias na admissão de pacientes com COVID-19 nos hospitais, principalmente nos estágios iniciais da pandemia, quando o conhecimento sobre o vírus era limitado para os afegãos com poucos recursos. “Nos primeiros dias do COVID-19, os seminários virtuais do MCAN ajudaram-nos a diagnosticar (os kits de teste eram limitados), tratar e usar o conhecimento mais avançado disponível nos hospitais europeus”, conta Rafiee. “Aprendemos sobre as alterações radiológicas que o vírus provoca nos pacientes afetados e a melhor abordagem na terapia de oxigénio para tratar as pessoas com COVID-19 internadas no nosso hospital”, lembra Rafiee. 

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Durante a pandemia, o MCAN e sua equipa desempenharam um papel significativo no uso da tecnologia para apoiar os seus colegas profissionais de saúde em todo o Afeganistão. Ele representa um exemplo bem-sucedido do poder das organizações da diáspora para aproveitar a tecnologia e transferir conhecimento médico, desempenhando um papel vital na ligação entre os países de acolhimento e origem. 

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Ali Ahmad Safi

Ali Ahmad Safi está a fazer o doutoramento no Departamento de Migração e Globalização na Universidade do Danúbio em Krems, na Áustria. Ele recebeu o seu diploma de Mestre em Estudos sobre Paz e Conflitos pela Universidade Europeia da Paz (European Peace University). Desde 2015, Safi também trabalha como consultor do Instituto para o Diálogo e a Cooperação Internacional de Viena, onde vive. Como médico, ele também trabalhou em várias pesquisas internacionais e organizações de comunicação social e publicou diversos trabalhos sobre questões políticas, de segurança e sociais no Afeganistão. Suas áreas de pesquisa incluem migração, diáspora, organizações da diáspora e agentes não-estatais de segurança no Afeganistão.

Twitter: @doctorzdf

Email: Ali.safi@donau-uni.ac.at

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This article is part of the issue ‘Empowering global diasporas in the digital era’, a collaboration between Routed Magazine and iDiaspora. The opinions expressed in this publication are those of the authors and do not necessarily reflect the views of the International Organization for Migration (IOM) or Routed Magazine.

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